quarta-feira, 15 de maio de 2013

"Faroeste Caboclo", versão para o cinema da música da Legião Urbana, estreia no dia 30

"Não tinha medo o tal João de Santo Cristo..." Seguisse a risca os nove minutos seguintes da composição de Renato Russo que todo bom adolescente sabia de cor no fim dos anos 1980, a versão para as telas de Faroeste Caboclo tinha tudo para resultar em uma trama longa, inverossímil e cheia de clichês.
O filme que estreia no próximo dia 30, no entanto, é um faroeste mais simples, coeso e tão forte quanto a canção de acampamento que a originou.
Exibido terça-feira em sessão exclusiva para a imprensa de Brasília, Faroeste Caboclo é a conjunção de um bocado de pessoas certas nos lugares certos que começou no Festival de Gramado de 2001. Ao entrar na sala errada, onde achava que seria exibida uma homenagem ao ator Hugo Carvana, o produtor Daniel Filho assistiu sem querer ao curta Sinistro, do brasiliense René Sampaio. A escalação do estreante em longas para a desafiadora tarefa de adaptar a canção de Renato teria dedo seu.
Além de ter um brasiliense na direção, fundamental para o bom aproveitamento da Brasília oitentista como cenário, Faroeste Caboclo contou com o escritor Paulo Lins no roteiro, autor do romance Cidade de Deus. Como na célebre favela carioca, Lins faz da trama um tratado sobre a formação da capital federal e suas primeiras tensões sociais.
– Era uma juventude que tinha que achar o que fazer nesse lugar plano em que não havia sequer um precipício para se jogar – resume Ísis Valverde, a Maria Lúcia do filme.
O encontro entre João e Maria Lúcia é simbólico. Ele, um imigrante à beira da criminalidade acomodado na Ceilândia, uma das caóticas cidades satélites para quem não tinha lugar na cidade planejada por Oscar Niemeyer. Ela, a princesinha maconheira na janela de um confortável apartamento funcional do chamado Plano Piloto, onde mora com o pai senador – vivido por Marcos Paulo, em seu último papel no cinema.
– João tem um pouco do espírito do Renato como trovador solitário. É como se ele tivesse pensado: e se eu fosse negro, baiano, como essa cidade iria se relacionar comigo? – diz Fabrício Boliveira, que interpreta o protagonista com firmeza e discrição.
Em nome de uma história coerente, muito da letra ficou de fora do roteiro, o que pode desagradar aos fãs mais xiitas da Legião Urbana. Mas não faltaram referências como a pistola Winchester 22 ou a Rockonha, presente naqueles versos cujo significado ninguém de fora de Brasília entendia até o advento do Google.
Entre as mudanças mais significativas, está o confronto final entre o mocinho e o bandido Jeremias. O duelo é filmado com a brutalidade e os planos clássicos de um bom faroeste, mas sem a transmissão ao vivo em rede nacional. A escolha, que apela mais para a coerência interna da trama do que à grandiloquência, é justificada pelo diretor Sampaio de forma mais criativa:
– Talvez o desejo de Renato se concretize agora. Só que, em vez de o Brasil ver o duelo na TV, vai assistir no cinema. Para, aí sim, crucificar ou beatificar o João de Santo Cristo.
*Colaborou Rodrigo Saccone.


Fonte: pioneiro